Em 2003, quando minhas filhas mais novas estavam com 5 e 3 anos, certa vez, tendo esgotado meu repertório de histórias de ninar, resolvi escrever um conto infantil de Natal exclusivo para elas. Agora o encontrei ao organizar arquivos antigos. Quem sabe possa ser útil a algum pai com repertório esgotado.
Na noite de Natal Papai
Noel sempre aparece, isso todo mundo sabe. O que ninguém sabia até agora é que
houve uma vez em que ele quase não apareceu. Ou será que não foi bem assim?
As crianças estavam prontas, haviam colocado roupa nova e
esperavam com ansiedade pela chegada do velhinho de barba branca que traz presentes
e gosta de dizer hou-hou-hou-hou. Ninguém sabe por que ele diz isso, mas não
importa. Enquanto mamãe preparava a comida, suas duas filhinhas, Lísia e Milla,
olhavam pela janela a todo instante. Elas mal podiam esperar. Logo Papai Noel
chegaria carregado de presentes. Elas suavam bastante. Fazia calor, mas o
motivo principal do suor era o nervosismo pela espera.
Hora após hora elas grudaram seus rostinhos delicados na vidraça, observaram o pisca-piscar dos arranjos de luz e o alvoroço das pessoas, muitas chegando às casas vizinhas para a ceia, muitas deixando as casas vizinhas para cear em outro lugar, o som estridente das buzinas e o estouro dos fogos de artifício a desenhar formas coloridas no céu. Tudo muito lindo, mas onde estava Papai Noel? Para entendermos direito esta história é necessário voltarmos no tempo. Na casa das meninas, era aquele mesmo dia. Em certo lugar, cuja passagem de tempo era diferente, uns dez dias antes.
Hora após hora elas grudaram seus rostinhos delicados na vidraça, observaram o pisca-piscar dos arranjos de luz e o alvoroço das pessoas, muitas chegando às casas vizinhas para a ceia, muitas deixando as casas vizinhas para cear em outro lugar, o som estridente das buzinas e o estouro dos fogos de artifício a desenhar formas coloridas no céu. Tudo muito lindo, mas onde estava Papai Noel? Para entendermos direito esta história é necessário voltarmos no tempo. Na casa das meninas, era aquele mesmo dia. Em certo lugar, cuja passagem de tempo era diferente, uns dez dias antes.
A noite avançava
rapidamente em direção ao dia e Papai Noel trabalhava duro. Faltava pouco tempo
para a noite mais esperada do ano, em especial pelas crianças, e havia muito
que fazer. A cada vez aumentavam as crianças e os pedidos. Embora estivesse
velhinho e o clima não ajudasse, pois era inverno rigoroso no Pólo Norte, Papai
Noel, ou Papaiel, como o chamavam seus ajudantes duendes e as crianças pequenas
que ainda não sabiam falar direito, sempre encontrava forças o bastante para
fazer mais e mais. Era difícil atender a todos, mas ele bem que tentava. Ele
trabalhava com afinco quando um esquilo começou a observá-lo pela janela.
Douglas, este era o nome do esquilo, sentia fome e frio e, quando viu o fogo
ardendo na lareira e as nozes, castanhas e avelãs, seus pratos prediletos, bem
torradinhos num pote de ferro ao pé do fogo, decidiu que merecia se aquecer e
comer aquelas delícias.
Papai Noel estava concentrado demais no trabalho
para prestar atenção a um simples esquilo. Depois de terminar mais uma pilha de
brinquedos, ouviu alguém, ou algo, batendo à porta. Largou as ferramentas e foi
ver quem era, ou o que era. Abriu a porta, recebendo no rosto um golpe de vento
e neve, mas nada havia ali. Olhou para um lado e para o outro, e depois para o
bosque à sua frente. Caminhou até a entrada do bosque e, enquanto fazia isso,
Douglas entrou correndo e se escondeu num canto escuro próximo à lareira. Ali
estaria aquecido e esperaria pelo momento certo de abocanhar algumas especiarias.
Os ajudantes estavam tão concentrados que nem perceberam. Papaiel desistiu de
encontrar alguém na noite gelada, fechou a porta e voltou aos seus afazeres.
Passaram-se alguns minutos e Douglas julgava ter conseguido
seu objetivo quando Papai Noel, sem parar de fabricar os brinquedos e sem
sequer virar o rosto na direção do aconchegante cantinho, falou com sua voz
forte e gentil:
– Sirva-se logo, Douglas, do contrário as guloseimas vão
torrar demais e o gosto já não será tão bom.
Douglas, que se
julgava muito esperto, saltou de susto e ficou à mostra. Papai Noel continuou:
– E chegue mais perto do fogo. Você estava quase congelando
lá fora. Deveria ter vindo mais cedo.
Embora estivesse cada vez mais surpreso, a oferta era
irresistível. Uma vez descoberto, não havia mais razão para adiar o esperado
momento de se aquecer de verdade e matar a fome. O velhinho continuava
manejando seus instrumentos com habilidade, formando em poucos minutos novas
pilhas de brinquedos, enquanto os duendes ajudantes tentavam acompanhar seu
ritmo.
Depois de se deliciar com muitas avelãs e umas poucas
nozes, Douglas pensou em como gostaria de saber falar para agradecer e,
principalmente, para fazer algumas perguntas.
– Mas você pode. – disse Papaiel.
Douglas olhou-o com desconfiança. O que ele queria dizer
com aquilo?
– Você pode falar, ora. Não é o bastante?
O assustado esquilo entendia cada vez menos. Ele não era
igual aos outros, isso compreendera desde pequeno, se é que algum dia possa ter
sido chamado de pequeno. Douglas era bem maior do que um esquilo normal. A
força não o ajudava muito na hora de encontrar comida, e precisava sempre comer
mais do que os outros. Tanto que havia sido expulso de sua aldeia. Não havia
nozes e avelãs que dessem conta de seu gigantesco apetite. Mas tamanho era uma
coisa. Daí a poder falar...
– Mas pode, acredite em mim. – afirmou Papaiel, e Douglas
agora teve certeza de que ele conseguia ler seus pensamentos.
Sem saber o que fazer, o esquilão preferiu esperar.
Precisava saber mais sobre a situação antes de testar as cordas vocais.
– Você não acha que entrou aqui porque me enganou, acha? Eu
o esperava. Na verdade, o fiz vir até aqui. Mas creio que já é hora de você
receber algumas explicações.
Douglas concordou com um aceno de cabeça. Não estava certo
se sairia voz humana caso tentasse. Papai Noel largou as ferramentas, caminhou
até um sofá próximo à lareira, sentou-se e sinalizou para que ele fizesse o
mesmo. Pelo jeito, a coisa era séria. E era. Papaiel começou a explicar a
situação.
– Tudo começou no Natal passado. Uma menina ficou zangada
comigo porque eu lhe dei a boneca errada, sabe, isso não deveria acontecer, na
verdade nunca havia acontecido antes, mas aconteceu e, embora muito pequena,
ela ficou furiosa. Ajoelhou-se, chorou muito e, enquanto batia com as mãos no
chão, disse que nunca mais queria me ver. Todos sabem que não mereço isso, mas
ela era de fato muito pequena e não sabia.
– E daí? Era só uma menina mimada. – disse Douglas, que deu
um pulo no sofá ao perceber que havia falado.
– Aí é que está o problema. Aconteceu então algo muito
raro. Justamente enquanto a menina falava, os Anjos do Natal fizeram Coro. Geralmente
só fazem o Coro para coisas boas.
– E daí? – perguntou de novo Douglas, tentando se acostumar
ao dom da fala.
– Bem, uma vez que eles fizeram o Coro o pedido da menina se
tornou realidade.
– Como assim?
– Eu nunca mais poderei vê-la, e isto significa não ver
qualquer criança do mundo, pois eu não poderia deixar apenas uma de lado, o que
quer dizer que o Natal para mim, e para todas as crianças, acabou. A menos
que...
– A menos que o quê? – por ter acabado de receber a capacidade
de se comunicar com os humanos, Douglas estava ansioso.
– A menos que o encantamento possa ser desfeito. – explicou
Papai Noel.
– E pode?
– Sim, se acharmos a avelã dourada em tempo.
– Avelã dourada?
– Sim. Só ela, quando aberta, libera uma substância mágica
capaz de desfazer o encanto. É uma longa história.
Noel começou a
contá-la. Douglas prestava muita atenção a cada palavra.
– Tudo aconteceu há muito tempo. Um homem bondoso e solitário
passava a maior parte de seus dias contando histórias para divertir as
crianças. Sempre que sobrava um tempinho, estudava o que podia sobre os Anjos.
De tanto aprender, com o tempo até conseguiu conversar com alguns, ficaram
amigos e eles lhe deram um saquinho dourado de presente. Dentro havia um pó também
dourado com poderes para desfazer um Coro dos Anjos. Conforme lhe explicaram,
somente uma pessoa tão generosa e honesta como ele mereceria receber tal
dádiva. O Coro dos Anjos pode ser muito bom, se for cantado junto com bons
pensamentos, pois tem o poder de realizar desejos. Mas às vezes, por uma
armadilha do destino, o Coro coincide com um mau pensamento e ele também se
realiza. Somente a substância dourada pode desfazer o feito.
O esquilão ainda não entendia onde se encaixava naquela
história.
– E o que eu tenho a ver com isso?
O velhinho não respondeu. Apenas continuou seu relato.
– Um dia este homem tão bondoso foi perseguido por uma
feiticeira muito má, que odiava ver as pessoas felizes e não o perdoava por
fazer as crianças sorrirem. Por isso, lançou-lhe um feitiço. Enquanto ainda
conseguia raciocinar, ele escondeu a substância dentro de uma avelã. Por causa
de seu conteúdo mágico, a própria fruta adquiriu uma cor dourada. A partir daí,
nunca mais se ouviu falar do homem e de seu precioso troféu. E é aí que você
entra.
– Eu?
– Sim, você. Quem melhor para procurar uma avelã do que um
esquilo? Você é o maior e o mais esperto de todos, por isso preciso de sua
ajuda. E é bom começar logo, pois o tempo é curto.
– Tenho escolha?
– Você não quer ajudar?
– É claro que eu quero, mas acabei
de chegar, as guloseimas estão uma delícia e a lareira mais ainda. E nem sei
onde procurar a tal avelã dourada.
– Trate de aproveitar o fogo e as
guloseimas. Você parte ao amanhecer. Conversaremos mais no café da manhã.
Douglas não conseguiria dormir,
pensando no que o aguardava no dia seguinte, mas tentou esquecer o assunto por
aquela noite e aproveitar a hospitalidade do velhinho. Além do mais, Papai Noel
já voltara ao trabalho.
No outro dia, o esquilão acordou
cedo. Havia dormido bastante, estava bem alimentado e aquecido. Mesmo assim foi
catar algumas nozes no pote de ferro. Não estava com fome, mas não sabia quando
comeria assim de novo.
– Não se preocupe, você não ficará
sem comida pelo longo caminho. – Papaiel o observava com um largo sorriso e lhe
estendia uma bolsa.
– O que é isso?
– Uma bolsa mágica.
– Ela está vazia. De que me serve
uma bolsa vazia?
– Ela apenas parece vazia. No
entanto, toda vez que você sentir fome, basta colocar a mão aí dentro e encontrará
muitas coisas deliciosas.
– Se você tem poder para fazer isso,
e para fabricar brinquedos para todas as crianças do mundo, por que não vai
você mesmo atrás da avelã dourada e sua substância mágica?
– Não posso fazer tudo. Até meus
poderes têm limites. Além do mais, se eu for não acabarei os brinquedos em
tempo. Aqui, como estamos num lugar mágico, sob as regras de um tempo mágico,
ainda faltam muitos dias, mas lá, onde todas as crianças me esperam, já é véspera
de Natal.
– E por que não pede a algum de seus
duendes?
– Já lhe disse, você é o mais
qualificado para a missão. Não me pergunte mais nada. Na hora, você saberá o
que fazer. Confie em mim. Eu confio em você. As crianças de todo o mundo
confiam em você. Agora vá. Siga seu instinto e tudo dará certo. Você encontrará
apenas dias claros. Quando o céu escurecer de maneira estranha, o tempo estará
se esgotando. Aí você terá de voltar.
– E se eu não estiver com a avelã
dourada?
– Ainda assim você terá de voltar.
Ao
dizer isso, Papaiel apontou a porta. O esquilão fez uma reverência com os
braços e a ajuda da cauda e saiu para o dia gelado. Sequer sabia por onde
começar. Tudo que sabia era que tinha de encontrar uma avelã dourada e liberar
a substância armazenada em seu interior.
Enquanto isso, do outro lado do mundo, Lísia e
Milla continuavam com os rostinhos colados na vidraça a observar o movimento da
rua e olhar para o céu sem parar, na esperança de, a qualquer momento, avistar
um trenó voador, conforme as histórias que papai e mamãe sempre lhes contavam.
Elas se preocupavam com a solidão dele, voando sozinho naquele trenó, apesar da
companhia das renas mágicas.
Mamãe continuava na cozinha. Elas não entendiam bem para
que passar tantas horas à frente de um fogão se a comida era o que menos
importava naquela noite. Isso caso Papaiel aparecesse. Os olhinhos lacrimejavam
ao pensar na possibilidade de ele não aparecer. Em seguida se iluminavam outra
vez. Não, ele nunca falhara, e não seria naquela noite que as desapontaria.
O esquilo Douglas caminhava havia
algumas horas quando encontrou uma menina chorando, recostada a uma árvore. Ela
lhe explicou que dissera que nunca mais queria ver Papai Noel, mas que estava
arrependida e não sabia o que fazer. Douglas já ia perguntar como ela fora
parar ali no bosque encantado, quando ela simplesmente desapareceu diante de
seus olhos. Mas, ao observar melhor a árvore, ele notou um buraco próximo às
raízes, do qual saíam algumas avelãs. Depois de certificar-se de que não havia
outro esquilo por perto, examinou uma a uma, mas nenhuma delas exibia a cor
dourada descrita por Papai Noel.
Douglas prosseguiu em sua jornada.
Dias se passaram sem que encontrasse qualquer coisa digna de atenção. Não sabia
calcular direito, mas, mesmo naquele mundo de tempo mágico, já deveria estar
próximo da véspera de Natal.
Ao longo do caminho, em mais de uma
ocasião Douglas pressentiu estar bem próximo de seu objetivo, mas no fim só
encontrava avelãs comuns. Às vezes perdia tempo comendo algumas até se lembrar
da bolsa mágica, que sempre lhe daria o alimento necessário.
Chegou então a uma aldeia que
parecia abandonada. As casas deviam
estar vazias, pois ali só havia silêncio. Nenhuma voz humana, sequer ruídos de
animais. Apenas o barulho do vento interrompia a solidão do lugar. Douglas
estava exausto depois de tantos dias de busca. Como a contagem do tempo era
diferente, nem um dia normal se passara, mas o cansaço era o mesmo dos vários
dias do mundo real, no qual as menininhas aguardavam com os rostinhos colados à
vidraça.
Douglas teve medo. Um lugar
abandonado ganha aspecto fantasmagórico. Preferiu caminhar até o início do
bosque, já fora da aldeia, onde encontrou uma árvore larga o bastante para que
se recostasse a ela e tirasse um bom cochilo. Acordou bem depois, não sabia o
quanto, mas tinha a impressão de que perdera preciosas horas dormindo enquanto
o Natal estava ameaçado. Sentiu-se um irresponsável, mas resolveu que a melhor
maneira de compensar isso era sair dali o mais rapidamente possível e partir em
busca da avelã dourada.
Viu então um enorme buraco naquela árvore, bem maior do que
qualquer outro que já tivesse visto. Aproximou-se devagar e espiou lá dentro.
Não tinha esquilo ou qualquer outro animal morando ali havia muito tempo, a
julgar pela poeira e as teias de aranha que cobriam o estoque de avelãs. A
exemplo de tudo o mais naquela aldeia, fosse quem fosse o morador daquela toca,
tinha se mandado junto com os outros habitantes. Era hora de ele ir embora
também. Antes, como estava com muita fome e esquecera outra vez a bolsa mágica,
comeu quantas avelãs pôde, retirando a grossa camada de pó de cada uma antes de
levá-las à boca. Depois, colocou a única que sobrou dentro da bolsa e avançou
bosque adentro.
Caminhou por pouco tempo até começar a sentir enjôo,
tontura e dor no estômago. O mal-estar era terrível, mas mais terrível ainda
era a idéia de desistir da jornada e decepcionar todas as crianças do mundo. Antes
de desmaiar, pensou ter visto um vulto entre as sombras das árvores e ter
ouvido uma voz sinistra dizer algo como “seja quem for, não há com o que me
preocupar, pois ninguém sobreviveria àquele veneno”. Concluiu que deveria ser
alucinação, pois agora também ardia em febre. Logo acabou desmaiando.
Despertou sentindo uma mão a lhe acariciar a cabeça e um
jarro despejando água em sua boca. A água tinha um gosto diferente. Não era
ruim, só não parecia água. Tentou abrir os olhos, mas ainda estava muito fraco.
Quando conseguiu abri-los, enxergou um vulto que lhe pareceu familiar. Fechou
os olhos e, quando tornou a abri-los, já não havia ninguém ali. Seu mal-estar,
no entanto, era pequeno agora e ele teve ânimo suficiente para se levantar e
tentar caminhar.
Como se num passe de mágica, o céu,
até então claro e sem nuvens, fechou-se e escureceu totalmente. De imediato,
Douglas se lembrou da conversa com Papai Noel:
“Quando o céu escurecer de maneira estranha, o tempo estará
se esgotando. Aí você terá de voltar.”
“E se eu não estiver com a avelã
dourada?”
“Ainda assim você deverá voltar.”
A aparência do céu não deixava dúvidas de que o momento
chegara. Ele havia fracassado, e era melhor não causar mais desilusão a Papai
Noel se recusando a retornar.
A viagem de volta foi rápida.
Afinal, ele não precisou procurar por nada. Apesar disso, pareceu durar uma
eternidade, tamanho era o sentimento de culpa do esquilão. Ao chegar à porta da
casa de Papai Noel, parou por um instante pensando no que iria dizer e ouviu
uma voz conhecida vindo lá de dentro:
– Entre, meu rapaz. Eu já sei de
tudo mesmo.
A porta abriu-se sozinha e Douglas
entrou devagar. Tinha mais vergonha do que medo. Sabia que o velhinho não lhe
faria mal, pois não fazia mal a ninguém. Sentiu-se ainda mais constrangido
quando Papai Noel lhe apontou a lareira e o sofá.
– Você deve estar cansado e gelado.
Ele respondeu que sim com um leve
aceno de cabeça.
– Dê-me a bolsa e descanse à
vontade.
Douglas ficou comovido. Havia
falhado e era tratado com tamanha gentileza e compreensão. Alcançou a bolsa a
Papai Noel, que parecia tranqüilo e feliz. O velhinho abriu a bolsa mágica,
tirou de dentro a avelã coberta de poeira e teia de aranha que Douglas guardara
antes de passar mal e da qual nem se lembrava mais. Jogou a bolsa em cima do
sofá, e em seguida ela desapareceu. Colocou então a avelã na palma da mão e
soprou-a com delicadeza. As partículas de pó se espalharam pela casa e aos
poucos caíram sobre o tapete. Quando parou de observá-las, viu que Papai Noel
sorria e tinha na mão uma avelã dourada.
Então ele conseguira. Mesmo sem o
saber, ele conseguira. Saiu de perto da lareira e se aproximou da avelã, que
ainda repousava na mão do velhinho. Papai Noel abriu-a, deixando sair uma nuvem
de pequenos pontos brilhantes e dourados. Mais do que se espalhar pela sala como
o pó fizera momentos antes, as partículas pareciam espalhar-se pelo mundo todo.
Douglas estava encantando olhando para aquela maravilha.
Quando a nuvem se dissipou, tudo
parecia mais verdadeiro, e ao mesmo tempo mais colorido, mais mágico. Papai
Noel caminhou pela sala e fez sinal para que ele o seguisse. Douglas não
entendeu até estarem em frente a um grande espelho de moldura dourada. Nele,
Douglas viu o Papai Noel e, ao seu lado, em vez de um esquilão, havia um homem.
Mesmo com o choque provocado por aquela visão, raciocinou o suficiente para
concluir que não era mais um esquilo. Em pouco tempo a memória voltou e ele se
lembrou de tudo. Da aldeia, das histórias que contava para as crianças, da
substância mágica, da feiticeira, da maldição.
– Exato. – disse Papai Noel, adivinhando mais uma vez seus
pensamentos. – Ao liberar a substância da avelã dourada, o feitiço se quebrou e
você voltou a ser o que era antes, um homem bom e generoso.
– Então você sempre soube?
– Sou um homem bem informado. E você
precisava enfrentar seu destino. Devo dizer que se saiu muito bem
– O que aconteceu lá na floresta?
– As avelãs estavam podres. Exceto a dourada, é claro, que
continha o antídoto capaz de remover a maldição.
– Mas o Natal estava mesmo ameaçado ou você inventou tudo
isso só para me testar?
– Você faz perguntas demais, meu caro. Aproveite sua nova
situação e brinde comigo. Ah, e pode me chamar de Papaiel.
Mesmo cansadas de tanto esperar, e diante dos apelos da mãe
para que saíssem um pouco da janela e comessem um docinho, Lísia e Milla não
desistiam. Papaiel jamais as decepcionara. Foi quando a mãe as chamava mais uma
vez que elas viram um brilho especial surgir lá longe no céu. Em seu trenó
voador, Papaiel sorria e gritava seu tradicional hou-hou-hou-hou enquanto
acenava para as crianças. Desta vez, no entanto, parecia haver alguém ao lado
dele.
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