O
batom na cueca e o preservativo clandestino
Segundo o velho dito popular, “tudo tem
explicação, menos batom na cueca”.
Sempre acreditei que, de fato, não havia justificativa possível para tal,
digamos, evidência, até que um dia...
Na época eu jogava (mal, mas jogava)
tênis regularmente, hábito que tento retomar. Certa vez, depois de
praticar um pouco pela manhã, cheguei e fui direto para o chuveiro. Quando já me vestia para almoçar e em seguida ir para o trabalho, minha mulher
entrou no quarto e, segundos depois, começou a gritar e me xingar, mas não
dizia por quê. Quando eu tentava perguntar o motivo da confusão, ela respondia
com o clássico “e ainda se faz de desentendido, seu cara de pau!” Deve ter dito
coisa pior, mas vamos manter a elegância do texto.
Como eu insistia em afirmar que não
sabia do que se tratava, ela enfim disse: “Este batom na tua cueca! Não
te faz de bobo, calhorda”, ou algo assim. Olhei para minha cueca, de fato havia
na barra algo ínfimo, mas que parecia mesmo uma marca de batom. “E tem a
coragem de mentir que estava jogando tênis.” A bronca persistiu por alguns
segundos. Como sempre acontece com quem se descontrola emocionalmente, ela
estava “cega” demais para perceber algo evidente e que eu tentava, em vão,
explicar: aquela cueca eu acabara de retirar da gaveta, a que eu usava antes
ficara no cesto de roupas do banheiro. Então, ainda que fosse uma marca de
batom, não seria daquele momento. E como ela costumava administrar a lavagem,
além de dobrar e guardar as minhas roupas, certamente teria visto antes, se
fosse o caso.
O mistério e a bronca persistiram até a
mãe dela chegar para o almoço. Ocorre que nossa máquina de lavar estava no
conserto. Como a mãe morava perto, ela levara as roupas para lavar lá. Depois,
minha então sogra fizera a gentileza de secar, passar e já trazer tudo pronto. Ao
verificar a roupa no varal, seguindo um hábito de gerações, encostava as peças
de roupa na bochecha para ver se estavam de fato secas. Muito vi minha avó
fazer isso quando eu era garoto. Num descuido, esbarrou no batom o suficiente
para deixar uma marca bem pequena, mas gigantesca aos olhos de uma esposa
enfurecida.
Passada a bronca, vieram as risadas e,
por fim, a constatação de que daquele dia em diante já não valia mais o dito
popular, pois tudo tem explicação, até batom na cueca.
Mas pode um preservativo surgir do nada
em uma sacola de compras? Pode.
Esta aconteceu há poucos dias. Eu havia
feito compras em um shopping e carregava uma sacola da loja quando entrei na
farmácia em busca de analgésicos. Comprei, paguei e, já na saída, resolvi me
pesar. Pendurei a sacola naquele gancho na lateral da balança, pesei-me e fui
embora. Depois de dar uns poucos passos olhei para a sacola para ver se
havia ajeitado de modo adequado o pequeno saco plástico da farmácia para que
ele não caísse no caminho. Foi quando vi, solta dentro da sacola, a embalagem
bastante chamativa de um preservativo com os seguintes “dizeres”:
Prudence Cores e Sabores
Morangão
58mm – XXG
Enorme e com sabor.
Meu primeiro pensamento foi de voltar à
farmácia e devolvê-lo. Em seguida, pensei no que iria dizer. “Olha, eu não sei
como este preservativo foi parar dentro de minha sacola...” Mas logo concluí que
eu provavelmente me incomodaria de alguma forma, achariam que roubei e me
arrependi, por exemplo. Imaginei dizer: “Pensem bem, é claro que eu não
roubaria isso, por que diabos eu iria querer tamanho XXG, sou um cara
realista...” Mesmo assim, concluí que daria trabalho explicar, e como não era
algo de muito valor, melhor deixar pra lá.
A dúvida, no entanto, persistia: como
aquilo fora parar dentro da sacola de compras? Dias depois encontrei um amigo,
contei o que havia ocorrido e ele decifrou o enigma. “Tem um totem de venda de preservativos
ao lado da balança, bem próximo mesmo, sempre esbarro nele quando vou me pesar,
você deve ter batido com a sacola e uma embalagem foi parar lá dentro.” Pelo
que o conheço, ele provavelmente costuma é esbarrar na balança quando vai
comprar preservativos, mas isso não é da minha conta. O importante é que o
pequeno mistério estava esclarecido. E a embalagem repousa em uma gaveta de
minha mesa de trabalho. Fechada, é claro, e assim permanecerá até que eu a
ponha no lixo, afinal, é “morangão XXG”.
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