Uma
viagem memorável ao Vietnã
O texto a seguir foi publicado na edição de agosto da revista Hotelnews.
O Vietnã sempre me despertou grande interesse. Quando fui a Tóquio cobrir Grêmio x Ajax pelo Mundial de Clubes, em dezembro de 1995, aproveitei e, na sequência, rumei para aquele país na companhia do fotógrafo Ricardo Chaves. O Kadão, cujo apelido alude aos seus bem mais de cem quilos, mas poderia se referir ao talento e à elegância, foi um parceirão o tempo todo, e com ele vivi algumas experiências divertidas. Começamos pela capital Hanói, depois fincamos sede em Huế – antiga capital imperial e palco de uma das mais sangrentas batalhas do conflito, durante a célebre Ofensiva do Tet, em 1968 – e encerramos com uma temporada em Saigon, base americana na guerra e hoje oficialmente chamada de Ho Chi Minh City.
O Vietnã sempre me despertou grande interesse. Quando fui a Tóquio cobrir Grêmio x Ajax pelo Mundial de Clubes, em dezembro de 1995, aproveitei e, na sequência, rumei para aquele país na companhia do fotógrafo Ricardo Chaves. O Kadão, cujo apelido alude aos seus bem mais de cem quilos, mas poderia se referir ao talento e à elegância, foi um parceirão o tempo todo, e com ele vivi algumas experiências divertidas. Começamos pela capital Hanói, depois fincamos sede em Huế – antiga capital imperial e palco de uma das mais sangrentas batalhas do conflito, durante a célebre Ofensiva do Tet, em 1968 – e encerramos com uma temporada em Saigon, base americana na guerra e hoje oficialmente chamada de Ho Chi Minh City.
Em Hanói vivemos a experiência algo
perturbadora de atravessar cruzamentos de largas avenidas sem sinais de
trânsito ou qualquer regra, entre automóveis, caminhões, ônibus, motos,
lambretas, bicicletas, riquixás e muita gente, tudo junto e misturado, na base
do drible mesmo, tanto quanto experimentamos becos residenciais ou de intenso
comércio. Numa rua calma, quase sem movimento, alguns meninos jogavam futebol.
A bola foi chutada em minha direção, fiz algumas embaixadas e a devolvi, para
“delírio da galera”, até porque usávamos bonés com o logo da empresa e a
bandeira do Brasil. “Ronaldo, Romário” começaram a falar os meninos, enquanto o
Kadão – com bolsa de fotógrafo e tudo – e eu brincávamos com eles por alguns
minutos.
Senti-me no filme Bom Dia, Vietnã, e aí me lembrei de observar os rostos das mulheres.
Os homens vietnamitas são, quase todos, muito feios, na boa, mas há abundância
de mulheres lindas, constatação feita já a partir da tripulação do Boeing 737
estalando de novo da Vietnã Airlines no qual havíamos embarcado na escala em
Taiwan. Em Hanói fixei-me no rosto de uma e a segui mentalmente na multidão,
mas ela logo estava ali, e lá, e em várias outras, como no filme, todas com o
mesmo corte nos cabelos negros e as roupas típicas locais, que acho bem interessantes,
por sinal – as vestimentas e as mulheres. Uma beleza sedutora, mas com poucas
variações, digamos.
Ainda em Hanói, Kadão decidiu fazer uma foto do caótico movimento numa das principais avenidas. Não havia prédios altos por perto, e mesmo os mais baixos eram inacessíveis, pois não conseguíamos explicar aos temerosos ocupantes que se tratava de uma simples foto. Paranoias de país comunista. Kadão não teve dúvidas: escalou um trêmulo poste de madeira e fez a foto. Eu não resisti à tentação de dizer que espalharia história diferente: um homem daquele tamanho, balançando em cima de um poste, numa terra de gente miúda, não conseguira fazer a foto do trânsito porque o trânsito simplesmente parara diante de tal visão.
Obviamente, não faltaram momentos emocionantes e comoventes durante esta viagem, mas aqui, pelo foco da revista, convém que eu me atenha à parte mais light. Cumprimos o trajeto entre Hanói e Huế num turbohélice francês bem velhinho, pequeno e desconfortável. Depois de pedir para o Kadão parar brigar com um comissário que o obrigou a deixar o tripé com ele – e o devolveu quebrado –, briga inútil, um falando em inglês com sotaque brasileiro, o outro no incompreensível idioma vietnamita, eu tentava relaxar um pouco na precária poltrona quando o avião – de no máximo uns 20 lugares, muitos deles vazios – começou a sacudir. Demorei alguns segundos para perceber que não se tratava de turbulência, e sim do Kadão tentando matar a pontapés uma barata de boas proporções.
Já em Saigon, cidade mais moderna e cosmopolita, até em função da ocupação americana na guerra, hospedamo-nos num hotel barato qualquer, o primeiro decente que achamos, mas, depois de tantos dias comendo qualquer coisa em breves paradas ao longo das poeirentas estradas do interior do país, espanando as moscas da suspeita mistura de arroz empapado com algo que lembrava frango desfiado, decidimos jantar num belo restaurante com cardápio internacional. Tentamos a todo custo convencer nosso intérprete, Nguyễn Nghiễm Ngầm (pronuncia-se “Inhém Inhám”) a nos acompanhar, no entanto, como ele era funcionário público (mas nós pagamos pelo serviço), creio que não conseguimos, pois isso poderia ser considerado suborno, com graves consequências para ele. O restaurante era muito bom, a comida excelente, mas o que marcou mesmo foi o maître, absolutamente idêntico ao filipino de modos afetados e trajes escandalosos dono do bar em Bom Dia, Vietnã. Cheguei a pensar que se tratava de uma paródia, mas não, era sério.
Ainda em Hanói, Kadão decidiu fazer uma foto do caótico movimento numa das principais avenidas. Não havia prédios altos por perto, e mesmo os mais baixos eram inacessíveis, pois não conseguíamos explicar aos temerosos ocupantes que se tratava de uma simples foto. Paranoias de país comunista. Kadão não teve dúvidas: escalou um trêmulo poste de madeira e fez a foto. Eu não resisti à tentação de dizer que espalharia história diferente: um homem daquele tamanho, balançando em cima de um poste, numa terra de gente miúda, não conseguira fazer a foto do trânsito porque o trânsito simplesmente parara diante de tal visão.
Obviamente, não faltaram momentos emocionantes e comoventes durante esta viagem, mas aqui, pelo foco da revista, convém que eu me atenha à parte mais light. Cumprimos o trajeto entre Hanói e Huế num turbohélice francês bem velhinho, pequeno e desconfortável. Depois de pedir para o Kadão parar brigar com um comissário que o obrigou a deixar o tripé com ele – e o devolveu quebrado –, briga inútil, um falando em inglês com sotaque brasileiro, o outro no incompreensível idioma vietnamita, eu tentava relaxar um pouco na precária poltrona quando o avião – de no máximo uns 20 lugares, muitos deles vazios – começou a sacudir. Demorei alguns segundos para perceber que não se tratava de turbulência, e sim do Kadão tentando matar a pontapés uma barata de boas proporções.
Já em Saigon, cidade mais moderna e cosmopolita, até em função da ocupação americana na guerra, hospedamo-nos num hotel barato qualquer, o primeiro decente que achamos, mas, depois de tantos dias comendo qualquer coisa em breves paradas ao longo das poeirentas estradas do interior do país, espanando as moscas da suspeita mistura de arroz empapado com algo que lembrava frango desfiado, decidimos jantar num belo restaurante com cardápio internacional. Tentamos a todo custo convencer nosso intérprete, Nguyễn Nghiễm Ngầm (pronuncia-se “Inhém Inhám”) a nos acompanhar, no entanto, como ele era funcionário público (mas nós pagamos pelo serviço), creio que não conseguimos, pois isso poderia ser considerado suborno, com graves consequências para ele. O restaurante era muito bom, a comida excelente, mas o que marcou mesmo foi o maître, absolutamente idêntico ao filipino de modos afetados e trajes escandalosos dono do bar em Bom Dia, Vietnã. Cheguei a pensar que se tratava de uma paródia, mas não, era sério.