terça-feira, 23 de julho de 2013
Quando as noites não eram tão escuras
Tempo houve em que as noites, mesmo as mais frias e longas do rigoroso inverno do sul, não pareciam tão frias ou longas, ou ao menos era possível atravessá-las com razoável dose de sonho e esperança.
Pouco mais de seis da tarde, acabo de chegar da escola, mal tive tempo de fazer os temas, comer um pedaço de pão com patê de fígado ou schimia de abóbora com cravo acompanhado de Guaraná Frisante Polar e saí à rua para um jogo de taco, ou de bola, ou de bolinhas de gude, e já está minha avó a gritar meu nome. Emília, a quem eu chamo de mãe, cuida de mim enquanto minha mãe, Terezinha, a quem todos chamamos de Santa, trabalha para pagar a escola particular do único filho.
O brado de Emília significa que é hora de se recolher, sair do frio e do escuro, hora em que, ela diz, só os meninos sem eira nem beira, de pais relapsos e irresponsáveis, circulam pelas ruas do bairro de periferia. A violência urbana ainda não é o monstro que temem que se torne um dia, tampouco esta periferia é assim tão periférica, mas crimes e brutalidades de todo tipo espreitam na calada da noite por detrás de muros de esquina, árvores frondosas e cercas carcomidas de terrenos baldios.
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