quinta-feira, 11 de abril de 2013

Os suspeitos de sempre

Em 1994 eu era editor executivo do jornal Zero Hora e tinha, entre minhas tarefas, editar a capa do jornal e coordenar a reunião de capa, da qual nem sempre participavam o diretor de redação e o editor-chefe. Nesta reunião os editores de cada área apresentavam os assuntos que teriam destaque na edição. Logo depois da implantação do Real, ao final de uma reunião na qual todos disseram não ter nada interessante naquele dia – cheguei a brincar: “Ok, a gente cancela a capa” –, solicitei à Rosane de Oliveira, editora de política, e ao Moisés Mendes, da economia, que permanecessem mais um pouco comigo e com o Ricardo Chaves, editor de fotografia, pois não poderíamos sair dali sem ao menos uma sugestão de manchete.

Uma nova rodada com a Rosane não ajudou, ela tinha razão, o dia estava mesmo muito morno na política. Pedi então ao Moisés que repassasse todos os assuntos para uma nova avaliação. A abertura da economia seria um “pequeno aumento nos hortigranjeiros, coisa pequena, não dá manchete”. Perguntei então a ele se aquele não era o primeiro aumento de preços de qualquer produto depois do Real. Ele confirmou. Questionei então se os hortigranjeiros não eram costumeiros puxadores de altas de preços. Ele disse que sim. “Mas manchete não segura”, reforçou Moisés.
Quando não se tem uma grande manchete, a solução é ousar um pouco. Expliquei minha ideia ao Kadão e ele foi atrás da melhor imagem (sempre lembrando que não havia internet, não se achava qualquer foto no Google em segundos). A manchete formal eu nem lembro qual acabou sendo, mas o assunto dominante, ocupando uma grande área da capa, foi esse: uma foto bem grande de tomates, um superclose, com o título “Os Suspeitos de Sempre”. Trata-se de uma fala clássica do filme Casablanca: o chefe de polícia local manda prender “os suspeitos de sempre” como forma de agradar aos ocupantes nazistas da cidade e, ao mesmo tempo, nada fazer a respeito. O diretor de redação, Augusto Nunes, bancou a aposta e ZH foi às bancas com uma capa diferente, chamativa e, ao mesmo tempo, respaldada jornalisticamente pela boa cobertura da economia.
Quase 20 anos depois, Com os tomates na ordem do dia, resolvi contar esta pequena história.

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